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{o outro #4 - Juliana Brunes} "Eu gosto de compartilhar o que imagino ser uma sensação minha mas que, ao mesmo tempo, outros possam estar passando pela mesma situação".
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{o outro #4 - Juliana Brunes} "Eu gosto de compartilhar o que imagino ser uma sensação minha mas que, ao mesmo tempo, outros possam estar passando pela mesma situação".

Hey, psiu! Tá vendo esse botão “play” aí em cima? Ele é pra você que está sem tempo - ou que está com preguiça mesmo :P – de ler a confissão abaixo e conhecer nosse convidade. Apure seus ouvidos e ouça a essa conversa boa no podcast. Mas sem desculpas pra deixar esse conteúdo de lado, ok? :)


Olá você,

Seja no quesito hobbie ou carreira, a gente nunca gosta de uma “coisa só”, e felizes são os que conseguem juntar sua pluralidade ao desempenhar sua paixão. E isso foi exatamente o que aconteceu com a nossa quarta convidada da coluna {o-outro}, a artista visual Juliana Brunes.

Desde muito cedo a Ju tem diários e tem o gosto por expressar seus sentimentos e anseios através dele, no entanto, encontrou na colagem um jeito de ilustrar e de dar vida a seus escritos, que apesar da pouca idade, trazem o humor, a lucidez, e a seriedade de alguém que já viveu o bastante para poder compartilhar seus mais íntimos pensamentos (e angústias!) que, no fim, se encontram com o da maioria.

Assim, as colagens de Juliana expressam o que se passa na cabeça e no coração de uma geração que vê muito, sente muito, mas que ao contrário, precisa ler na velocidade da luz que um feed é alimentado na era digital — o atravessamento precisa ser imediato.

Chegou a hora de vocês terem o prazer de conhecer mais do mundo de palavras e imagens que compõem o trabalho de Brunes, que acabou confessando num textão antigo que o pior de tudo era exatamente essa naturalização de só fazer as coisas buscando a recompensa”. Bem, Ju, saiba que você estar aqui na Literatura Confessional, a meu ver, é uma recompensa pelo seu próprio esforço de seguir com sua arte. <3

A L.C EM UM CLIQUE

Larissa Xavier // Literatura Confessional

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Com vocês, Juliana Brunes se confessando em:

Conteúdo

É melhor escrever de manhã, ela pensou, sonolenta porém agitada. O prédio de frente ao seu tinha apenas uma sacada iluminada, aquela que também era a última a apagar as luzes de madrugada. Dorme tarde e acorda cedo, será que ao menos dorme bem? Voltou aos seus próprios assuntos. É melhor escrever de manhã, enquanto o sol nasce, porque só tem o som da chuva e nada mais, um silêncio bonito sem desgraça de jornal, sem grito de vizinho, sem gente acordada reclamando na internet. Muito mais fácil se concentrar assim. Dá até vontade de criar, de concretizar aquela ideia que wow, vai ser incrível e tocar as pessoas e… E talvez seja cedo demais pra tanto entusiasmo, pra desejar a glória. Mas se quase tudo que fazemos é pelo prêmio, então qual o problema? E aí mesmo é que estava o problema que ela não conseguia ver. Não percebia que o pior de tudo era exatamente essa naturalização de só fazer as coisas buscando a recompensa.

A vida não pode se resumir a isso, não pode. No fundo ela sabia mas como era feio, não produtivo e triste admitir, continuou fantasiando sobre um futuro brilhante e farto que justificaria tudo, que justificaria o presente gasto. É que dava prazer o reconhecimento, um sentido que, apesar de raso, supérfluo, ainda era um sentido, e é isso o que as pessoas buscam, não é? Se eu puder lhes dar o que procuram, elas virão até mim. Foi o que Jesus fez e deu certo. Dois mil anos e os fiéis continuam aí. Foi o que fizeram políticos eleitos com promessas falsas e amantes escrotos cheio de sentimentos vazios para dar. De todos esses, só Jesus parece ter sido verdadeiro. E deve ser esse o ponto, a verdade. Por isso que durou dois mil anos e mais dois mil ainda há de durar.

Mas que verdade posso eu oferecer? Se o que eu tenho sou só eu e minhas experiências turvas meio apagadas para preservar minha integridade psíquica? Ela não sabia por onde começar. Se eu ao menos me anular, virar neutra, posso dar a cada um a verdade que imprimir sobre mim, aí é que está a estratégia. Sucesso, marketing bem feito, queridinha fada sensata. Se eu deixar que escolham meu nome, raciocinou, ligeira, não terei que fazer mais nada além de existir assim neutra, inexpressiva e aberta a interpretações. Se não puxasse a corda para nenhum dos lados, evitaria que uma opinião fosse tomada e quebrasse todo o custoso equilíbrio amoral construído sob medida para agradar a todo mundo. Meu nome é o que você quiser, pensou ela, com volúpia, quem eu sou não importa, o que interessa é o seu desejo. Tá aí, é isso que preciso fazer. Era essa sua maneira de se prostituir sem fazer sexo. A essência, apesar de tudo, era a mesma.

Pegou o celular e tirou uma foto de si mesma. Duas, três, aproximadamente vinte, das quais quatro ficaram razoáveis e apenas uma, ah, aquela uma! Aquela foto ficara invejável. Invejável porém neutra, como ela queria. Ou melhor dizendo, ambígua. Mas ela preferia a palavra “neutra” porque ambígua tem uma conotação meio ruim. Não era possível dizer quais eram suas intenções olhando para aquela imagem, se eram amáveis ou se ardiam pelo desejo de destruição. Tá aí o segredo, concluiu, triunfante. Não podem dizer que sim, mas também não podem dizer que não. Dei a brecha e agora cabe a eles preenchê-la. E não o farão com más palavras porque, como estou neutra, seriam covardes aos olhos dos outros e aos seus próprios se o fizessem. Seriam chamados de invejosos. Assim, o julgamento só poderia ser favorável. Ela tinha acabado de descobrir a verdade e, ao invés de revelá-la, decidiu perpetuar a farsa.

E a vida, a vida não devia se resumir a isso, ela bem sabia, mas a Megera-Sem-Nome estava em êxtase. Percerbera que a sua expressão de gozo não era compreendida pelos outros como tal porque ela a suavizara de tal forma que a vulgaridade não podia mais ser claramente encontrada. Mas o apelo ainda era o mesmo, sua aura não deixava de transmitir uma certa excitação, excitação que envolvia até ela própria quando olhava para suas imagens tão habilmente mistificadas. A vida não devia se resumir a isso mas quem era ela, mera humana feita de carne, para negar tamanho prazer a si? O masoquismo é bom mas às vezes nem tanto.

E continuou, e continuou, cada vez mais freneticamente, durante um período que não se sabe se foram horas, dias ou anos, porque estava absorvida demais para que prestasse atenção ao tempo. E o presente sempre gasto, o futuro sempre brilhante, mas o gozo sempre presente, e era isso o que importava.



BIOGRAFIA: Juliana Brunes, tem 21 anos, e estuda História da Arte. Está sempre recortando revistas e jornais pra criar novas imagens, escrevendo ideias pra depois transformar em arte ou até tocando violão desafinadamente pela casa. Gosta de ouvir e de contar histórias, de construir pontes, de questionar o que lhe é ensinado e de mudar de ideia através do diálogo. Através de suas colagerns, compartilha com os outros aquilo que a toca e que pode ajudar alguém a ter um dia melhor.

*Para acompanhar e apoiar seu trabalho, acesse seu Instagram!


Obrigada por nos ler/ouvir até aqui. Te vejo na próxima confissão. <3

Larissa Xavier // Literatura Confessional

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Revelando a interioridade de nosso eu mais profundo através de longas e íntimas narrativas contadas em primeira pessoa; por mim, Larissa Xavier, e por quem quer que queria se confessar. Porque somente a escrita pode libertar o que a vida faz aprisionar.